sábado, 22 de dezembro de 2007

A equipa do A ver passar comboios...

deseja a todos os seus passageiros

UM FELIZ NATAL

E

UM BOM ANO 2008

BOAS VIAGENS!...

quinta-feira, 6 de dezembro de 2007

Em Busca da Felicidade (Parte V)


Foto por: George Cereça


Seguiram de mãos dadas pelo passeio a caminha da felicidade ambicionada... será que iriam conseguir?! Será que as suas personalidades iriam conseguir unir-se?! Ninguém sabe... nem eles... mas, pelo menos naqueles curtos momentos que estavam a viver a sua FELICIDADE era ETERNA... o futuro... mais tarde se verá...


FIM

quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

Em Busca da Felicidade (Parte IV)


Foto por: rudolfo lopes


Apenas algumas horas passaram... mas, para ambos, pareceram largos meses... o sol do final de dia iluminava a face daquele homem que ali... sentado... permanecia, olhando a sua musa quase sem pestanejar...
No seu colo permanecia um jornal de aspecto político ou económico que trazia na fila debaixo do braço... que ali jazia... imóvel... exactamente como fora deixado quando o seu dono ocupou aquele lugar... nem sequer os olhos por ele passou... estava... hipnotizado... catatónico... apenas as funções vitais pareciam funcionar...

Hora de saída... mais apressadamente que nunca ela arrumou todas as suas coisas... a sua mesa ficou de uma forma que quase parecia que ia de ferias ou pelo menos, ficar ausente do emprego por vários dias... olhou para a porta lateral e ele rapidamente seguiu o seu olhar percebendo de imediato o que ela lhe estava a querer dizer...
Levantou-se e saiu num flash e esperou a sua saída em frente à porta... ela saiu... olhando para o chão com um aspecto tímido e inseguro... lentamente foi levantando o olhar até estar olhos-nos-olhos com aquele homem... lentamente ele alcançou a sua mão gelada e tremula e a acariciou levemente... entrelaçaram os dedos dando as mãos... e iniciaram uma caminhada pelo passeio...


(To be or not to be... continued)

terça-feira, 4 de dezembro de 2007

Em busca da Felicidade (Parte III)


Foto por: Paulutchy


Não conseguia falar... nem uma palavra lhe saia da garganta colada de emoção... soluçava apenas... num misto de riso e choro... felicidade e ansiedade... alegria e insegurança... e agora?! Pensava para si mesma...

Aguardando mais alguns segundos em frente ao vidro que os separava, ele ali aguardava... não sabia bem o que esperar ou o que estava à espera... mas não parecia querer mover-se um milímetro que fosse... MEXEU-SE... voltou-se quase 180º como quem se vai afastar ou ir embora... sendo esse o único gesto que fez descolar a garganta daquela vendedora de bilhetes – Onde vai?! – disse ela assustada. – Vai-se embora?!

Não!! – disse esboçando um sorriso – vou ficar aqui... daqui não saio sem uma resposta sua... sentando-se, ao fundo da sala... no ultimo banco... o mais longe da bilheteira mas estrategicamente de FRENTE para ela... e ali ficou... aguardando... pacientemente...


(To be Continued)

terça-feira, 27 de novembro de 2007

Viagens (Pensamento)






A vida de cada um de nós é feita de viagens. Algumas planeadas; outras sonhadas; ouras inesperadas ou imprevistas; viagens ao acaso, sem destino; outras de trajecto definido; e, no meio destas, outras tantas que nós perdemos. Assim é a vida de cada um. Viagens solitárias, a dois ou em grupo. Viagens sós que gostaríamos de ter partilhado com outro alguém e outras em que acompanhados gostaríamos de ter estado sozinhos. E, no meio deste turbilhão de pensamentos, por vezes, olhamos e o comboio que queríamos ou deveríamos ter apanhado já partiu e já é tarde de mais para voltar. Aguarda-nos a incerteza do futuro com a aprendizagem permitida pelas recordações do passado.

segunda-feira, 26 de novembro de 2007

Em Busca da Felicidade (Parte II)


Foto por: Filipe Monteiro


Olhou para ela de uma forma diferente, profunda… como se quisesse entrar dentro da sua mente… penetrar nos seus pensamentos... e assim ficaram por momentos que pareceram horas... olhando um para o outro... olhos nos olhos... espelhando e reflectindo as suas almas...

Acordando deste estado de hipnose ele disse - Peço desculpa menina, não me fiz entender e acabei por estar a fazê-la perder o seu tempo... a verdade é que não conheço nem pretendo ir para nenhuma localidade com esse nome... mas é verdade que o que pretendo de si é um “bilhete virtual” para a felicidade... há meses que por aqui passo e compro bilhetes para locais onde nunca fui, reservo lugares em comboios onde nunca entrei, ocupo cadeiras onde nunca sequer fiz tensão de me sentar... por um motivo apenas... para a ver... para falar consigo... para a poder olhar de mais perto... essa é a verdade... estou apaixonado por si... penso em si mais vezes por dia do que o numero de bilhetes que vende... é isso que quero de si hoje... o único bilhete verdadeiro... aquele que quero na realidade usar e guardar comigo... pois não passa de validade...

Um silêncio ainda maior tomou conta da estação... as pessoas calaram... gelaram... parecia que o tempo havia parado e até os comboios tinham deixado de passar... um raio de sol entrou pela janela e iluminou o rosto da menina da bilheteira reflectindo-se com maior intensidade numa gotinha... numa pequenina lágrima de emoção que lhe escorria pela face... os seus olhos brilhavam como nunca antes haviam brilhado parecendo duas estrelas...

O silêncio quebrou-se por um aplauso tímido ao fundo da fila que, qual onda que se forma no mar e se estende e ganha força até rebentar na praia, se propagou e contagiou todos os presentes tornando-se num aplauso sonoro e ruidoso que agora se fazia ouvir. Á medida que o aplauso aumentava de volume também as lágrimas de emoção aumentavam o seu ritmo de formação e queda no rosto da menina da bilheteira que chorava agora copiosamente...

(To be continued)

quinta-feira, 22 de novembro de 2007

Em Busca da Felicidade (Parte I)


Foto por: Alfredo Abano


Na fila da bilheteira um homem bem vestido e com aspecto de executivo de sucesso, daqueles que nem sequer andam de comboio, aguardava pacientemente a sua vez para comprar bilhete.
A fila avançava lentamente e após alguns minutos o mesmo homem ficou cara-a-cara com a menina da bilheteira.


Olá Bom dia! Queria um bilhete para a felicidade! – Disse num tom perfeitamente consentâneo com o seu aspecto. Desculpe! – Respondeu a menina do outro lado – disse que queria um bilhete para onde? Para a felicidade – respondeu de pronto o homem.

Fez-se um silêncio sepulcral na bilheteira, nem as crianças que até segundos antes brincavam ruidosamente ao fundo da estação pareciam conseguir soltar um som que fosse...
A menina após alguns segundos de inércia debruçou-se sobre o ecrã do computador que tinha a frente e começou a percorre-lo de ponta a ponta numa busca quase frenética... as pessoas que aguardavam na fila começavam a mostrar alguma impaciência e espreitavam por cima dos ombros uns dos outros tentando perceber o que se passava e o porquê da fila não avançar...

Mais uma tentativa... de busca... mas em vão... levantou-se a abandonou por momentos o seu lugar perante o quase desespero dos muitos que aguardavam na fila de espera... dirigiu-se ao gabinete do chefe da estação... após alguns segundos voltou com o mesmo olhar triste com que tinha entrado... dirigiu-se ao cliente e disse: Olhe, o senhor desculpe... mas é que eu não consigo encontrar nenhuma localidade com o nome que me indicou...

Ele... apenas sorriu...




(To be continued)

quarta-feira, 14 de novembro de 2007

Pensamentos em Surdina (ou um post do meu tamanho: pequenino)

*Foto por Cláudio Márcio Lopes



Novamente a vida os juntou, num outro comboio, a uma hora diferente do habitual.
A cidade acordava lentamente para a agitação e o corropio natural de uma semana que ainda vai a meio. O sol espreitava pela manhã mas, ainda ensonado, não abraçava os corpos de quem na rua passava.
Numa ponta da carruagem ela tremia e perguntava-se por que raio achava que ia ter calor e não houvera vestido um casaco, enquanto o seu olhar ia perscrutando os lugares ao seu redor e olhava com ansiedade para o relógio e para o telemóvel. Estava atrasado... porque não chegava nem dizia nada? Finalmente, viu-o ao fundo da carruagem. Expectante. Ansioso também. “Tonto. Enganaste-te. Era no 7 e não no 17.”
- Já ali estava há 5 minutos à tua espera...
- Ali? Não te vi...
- Pois eu reparei... tentei fazer-te sinal mas tu nada.
Olharam-se. Sorriram-se e repente ela sentiu-se quente e aconchegada. “Como a vida brinca connosco... Como a vida brinca...”

sexta-feira, 12 de outubro de 2007

Uma Viagem... Uma Vida (Parte I)

Foto por: Flávio Henrique Vieira


Entraram apressados e nervosos... o comboio já estava em andamento e a ganhar velocidade... tinham sido apanhados de surpresa com aquela viagem apesar do bilhete há muito comprado... e tantas vezes verificado e registado para não esquecer a data...

Os seus corações cavalgavam à velocidade da luz e pareciam a todo o momento querer sair do peito... tinham vivido momentos de alguma apreensão e... até algum pânico... mas agora esses sentimentos já estavam ultrapassados... ou melhor... permaneciam... mas algo transformados... digamos que os sentimentos eram agora como setas que apontavam para outras direcções...

Inicio de viagem conturbado... difícil... mas tudo o que os esperava não se adivinhava mais fácil, bem pelo contrário... por isso que os sentimentos eram confusos... ALEGRIA, FELICIDADE por um lado... e APREENSÃO e INSEGURANÇA por outro digladiavam-se a cada minuto... todos os minutos... das 24 horas do dia...

Por essa altura... essa era outra coisa que parecia ter mudado... o dia não parecia ter mais as 24 horas de sempre... parecia... no mínimo... ter mais umas 10 ou mais... mas todas da parte diurna... a noite parecia ter desaparecido... bem como o direito ao descanso...

Viviam momentos difíceis... o seu lugar neste comboio em andamento parecia ser o último... ao fundo... na última de todas as carruagens... mas o mais difícil era circular dentro dele de ponta a ponta por uma linha férrea sinuosa, íngreme e que não dava descanso aos passageiros...

Apesar de tudo isso... estavam felizes... cada momento daquela viagem era único... era especial... e apesar da sua dureza, com toda a certeza esta era uma viagem da qual iriam guardar todos os pormenores... para mais tarde... RECORDAR... com SAUDADE...


segunda-feira, 1 de outubro de 2007

sexta-feira, 28 de setembro de 2007

Futuro - Parte III: Confiança

*Foto por José Lopes



Conheceram-se numa viagem de comboio e a partir daí percorreram o mesmo trajecto juntos todas as manhãs e fins de tarde. Umas vezes falavam sem parar, riam, sonhavam, gracejavam. Outras vezes percorriam todo o percurso em silêncio, olhos nos olhos, pois estes falavam mais alto do que todas as palavras e assim, no silêncio, se compreendiam como ninguém. Raras vezes se tocavam. Os sentimentos que nutriam eram tão puros, fortes e autênticos que as almas já estavam unidas sem precisarem de mais que as completasse ou demonstrasse o que neles ia. Até que um dia ambos mudaram de comboio. Não houve avisos nem despedidas nem gritos nem lágrimas nem quaisquer questões. Não era necessário. Nenhum deles precisava de fazer notar ao outro que não o havia esquecido, que se lembrava sempre dele ou dela. Como esquecer se faziam parte um do outro? Como esquecer algo que está no nosso interior e que nos completa como ser? Impossível. E sabiam que, na altura certa, se voltariam a encontrar, num outro comboio, num outro trajecto e se olhariam em silêncio, sorririam e sentiriam que há viagens que não precisam ser marcadas...

quarta-feira, 26 de setembro de 2007

O futuro não chega


* Foto de Heloísa Gralha



A fila da bilheteira parecia nunca mais acabar. Parece que toda a gente havia decidido viajar naquele dia, mas não, era assim todos os dias, a todas as horas. Era uma estação muito concorrida e como era obrigatório reservar lugar nos comboios, muita gente era obrigada a esperar horas pelo seu comboio pois todos os outros partiam lotados. Assim foi também com ela mas agora ali estava, de bilhete na mão que tremia nervosa, tentando regularizar a respiração com esforço tal era a ansiedade. Tinha pressa em chegar ao seu destino mas balançava entre a curiosidade e a esperança e o receio movido pela incerteza. Finalmente, lá vislumbrou o seu comboio e aproximou-se, procurando a sua carruagem. Era estranho. Todos os lugares estavam virados para a direcção contrária. Todos. Encolheu os ombros e sentou-se no seu lugar, pensando que talvez noutra carruagem os bancos estivessem virados para a direcção correcta. Soou o apito e ela sentiu-se estremecer, mas foi assolada por nova surpresa. O comboio havia iniciado marcha lenta mas na direcção contrária. Andava para trás! Olhou para o bilhete. Não compreendia. Envergonhada mostrou o bilhete ao passageiro do lado e perguntou-lhe se aquele comboio se dirigia para aquele destino, não se tivesse ela enganado e tomado o comboio errado. Mas reparou que muitos pareciam tão confusos quanto ela. Outros não se pareciam incomodar com a situação. Ela, porém, esperara tanto para chegar ao futuro... e agora andava para trás.

segunda-feira, 24 de setembro de 2007

O FUTURO...


Foto por: rudolfo lopes


...como em todas as segundas-feiras da sua vida, ou pelo menos até onde a memória alcança, lá ia ele no comboio que o levava todos os dias à mesma hora para o emprego... Sentado no mesmo lugar “de sempre” lá ia ela à janela mas sem ver nada do que lá fora se passava... também, o que haveria de novo para ver?! Era tudo sempre igual... sempre fora assim... e sempre assim seria... desde que se recordava saia sempre à mesma hora de casa e há mesma hora chegava ao destino... a carruagem onde sempre seguia transportava sempre as mesmas pessoas... ou, pelo menos, aos olhos dele pareciam sempre os mesmos rostos, cansados e tristes, como o dele... a caminho de apenas e só... MAIS UM DIA...

Estranhamente sentia-se observado... algo de diferente se passava naquela viagem... olhou em volta lenta e discretamente... mas tudo estava... na mesma... todos estavam a dormir ou naquele estado de hipnose de quem pensa que assim consegue aproveitar mais uns minutos do descanso que não teve durante a noite...

Algo se passava... continuava a sentir-se observado... alguém o olhava fixamente mas por muito que tentasse não conseguia ver nem quem nem de onde o fazia... olhou novamente pela janela como quem finge que tem interesse pelo movimento da cidade lá fora... subitamente, detectou um vulto no vidro... um reflexo... sim, era isso mesmo... pelo reflexo do vidro podia ver claramente alguém que o olhava fixamente... afinal tinha razão... voltou-se rapidamente mas já não viu ninguém... que estranho... ainda agora aqui estava... olhou novamente para o vidro e lá estava ele de novo... mas sempre que ele tentava visualizar esse personagem ele parecia desaparecer... estava a ficar nervoso, sem perceber o que se passava... como é que era possível?!? Só conseguia ver o homem no vidro?!? Porquê?!? Quem seria ele?!? E porque é que estava ali a olhar fixamente para ele?!? Tantas perguntas... nenhuma resposta...
Olhou novamente para o vidro e voltou a ver o reflexo do homem... mas desta vez não se voltou... olhou-o fixamente através do vidro sem pestanejar... como que a tentar intimidar o indivíduo pagando-lhe com a mesma moeda...

O que fazes?!? – Ouviu – o mesmo que tu! – Respondeu de pronto. Quem és tu? O que queres de mim? Porque me olhas assim? Conheço-te de algum lado?

Tantas perguntas – disse o homem – e a nenhuma delas vale realmente a pena responder...

O quê?!? Estás a gozar comigo não?!? – disse ele já algo enervado com a situação...

Não... nada disso... queres mesmo saber quem sou eu?! – Sou o futuro!!

O FUTURO?!? Está bem está... não me lixes... deves pensar que nasci ontem não?!?

Como queiras!! – respondeu o homem... apenas te respondi aquilo que me perguntaste... eu bem te disse que não valia a pena responder a nenhuma das tuas questões...

Hummm... ok.. imaginemos que eras mesmo o futuro... e daí... o que fazes aqui e o queres de mim?!

Eu?! – disse o homem?!? – Eu não quero nada de ti... és tu quem quer de mim...

Ai ai ai... assim não nos entendemos... eu?!? Eu nem te conheço!

Exactamente! – disse o homem – não me conheces... nem podes conhecer... como te disse sou o futuro e não o presente ou o passado... como me quererias tu conhecer?!

Oh pá!! Granda tanga... deves ser é um desses cromos que quer vender alguma treta ou dalguma dessas seitas religiosas ou o raio que o parta... procura outro pá... que de mim não levas nada...

Como te disse, de ti não pretendo nada... foste tu quem me chamou... és tu que queres algo de mim... só não sabes o quê... esse é o teu problema... e é por isso que aqui estou... para saber o que queres tu de mim...

Tá bem tá... eu?!? De ti?!? Mais dinheiro e menos horas de trabalho... é isso que eu quero!

Ok... certo... já percebi... e o que me estás tu disposta a dar em troca?

A dar em troca?!? Eu vi logo que aí havia coisa... já me estás a querer lixar...!!

Sim, claro... pensas que é só pedir?!? Eu não sou nenhum génio da lâmpada magica... não concedo desejos em troca de coisa alguma... tens que me dizer o que estás disposto a fazer para obteres o teu desejo... mas não é por mim que o fazes ou tens que fazer... é por TI... por TI PRÓPRIO?!?

Por mim?!? Tu não estas bem... de certeza!! O que é que eu posso fazer por mim que sirva de moeda de troca para tu me concederes os meus desejos... não faz sentido!!!

Olha... vou dar-te uma ajuda... existem 3 formas de me ver e de me interpretar:

- para os fracos, eu sou algo inatingível;
- para os temerosos, eu sou totalmente desconhecido;
- mas para os corajosos, eu sou a oportunidade...

Agora pensa... e escolhe... a qual destes grupos queres pertencer... não precisas de me dar resposta... assim que tiveres feito a tua escolha... EU... saberei...

segunda-feira, 10 de setembro de 2007

Viagem Adiada



Acordou há hora de sempre, mas mais cansado que nunca... parecia até que não se tinha chegado a deitar... a noite tinha sido dura... a roupa suada assim o mostrava apesar de nada se lembrar. Arrastou-se pela casa vagarosamente como um plano de um filme de Manoel de Oliveira e a muito custo preparou-se para sair.
Tinha uma viagem para fazer, mas desde o dia anterior parecia sentir que não era o dia certo para a fazer... algo lhe dizia isso. No entanto, lá foi, seguindo o seu caminho em direcção à estação e tudo parecia correr com normalidade...

Chegou à estação, mas apesar de não ser para ele um local desconhecido, parece que estava diferente, mudado, algo se passava... estava tudo incrivelmente calmo, calmo demais... entrou pela porta principal e reparou na bilheteira... estava vazia... ninguém... como iria ele comprar bilhete?!? Rondou todo o átrio à procura de alguém que lhe explicasse o que fazer... mas nada! Nem um simples papel ou cartaz anunciava qualquer indicação... estava tudo perfeito, limpo, arrumado, mas vazio... vazio de tudo... de pessoas, de ruídos, de gestos... parecia uma estação “fantasma”...

Olhou em volta e reparou nos únicos Seres que pareciam lembrar que o mundo não havia parado... pássaros percorriam o chão lá fora saltitando em busca de uma migalha que lhes compusesse o estômago.

Bateu a uma porta... demorada e arrastadamente ouviu um som de alguém que parecia aproximar-se... aguardou... era mesmo... afinal estava alguém... era um segurança com ar ensonado... e perguntou-lhe o que se passava... não soube responder... encolheu os ombros e sorriu como quem não entendeu uma única palavra daquilo que ele tinha dito... repetiu, voltando a dizer que precisava apanhar o comboio em direcção a Lindstrom e queria saber a linha e como fazer para comprar bilhete... voltou a sorrir, falando num dialecto desconhecido e encolhendo novamente os ombros... e agora?! – Pensou... – Como vou fazer?!

Decidiu aguardar por alguns momentos, pegou no telemóvel e ligou para a sua esposa a contar o sucedido, talvez ela soubesse de alguma coisa ou o pudesse ajudar... olhou novamente em volta e até o segurança tinha desaparecido... procurou por ele novamente junto à salinha de onde o vira sair momentos antes, mas nada! Também ele tinha sumido... não sabia o que fazer... talvez se aguardasse um pouco mais, talvez passasse alguém que lhe explicasse o que se estava a passar... mas nada...

Saiu pela porta e voltou a olhar em volta, para os pisos superiores, podia ser que detectasse neles algum movimento... mas o resultado foi exactamente o mesmo... nulo... parecia estar numa daquelas cidades fantasma do “velho oeste” pois o único barulho que se ouvia era o do vento quente...

Desistiu... não tinha como saber o que se estava a passar... voltou para casa na esperança que amanhã a estação, por “artes mágicas” volte ao normal e ele possa seguir finalmente viagem...


sexta-feira, 31 de agosto de 2007

Para Sempre...



O dia espreitou pela janela do meu quarto com um sorriso tímido, mas com aquela força e calor que já senti noutros tempos no conforto do teu abraço.
Abri os olhos lentamente, passando os dedos nos “cristais do sono” que me incomodavam e aí fiquei a observar o clarão solar que me iluminava o rosto.
Os ponteiros do relógio não cessaram as suas funções, continuaram a sua contagem dos segundos, minutos, horas e dias...
Sempre foi assim... o tempo não pára e muito menos efectua a sua viagem de retrocesso.
Desejaria muito recordar-te hoje com outros sentimentos e não a data da tua partida.
Fui caminhando de mãos dadas com o calor do brilho que me despertou até à estação de comboio, onde tu partiste.
Hoje não vim sozinha, tenho a companhia do meu Samurai "R", a quem eu vi nos teus olhos a alegria e o brilho de felicidade no vosso reencontro, e da tua netinha que muito em breve dará o seu primeiro, de muitos, choros, para anunciar a sua vinda ao mundo.
Não havia sinais de movimento, mas os rastos de memória que deixaste ao longo do caminho permanecem bem marcados em cada centímetro dos carris que se estendem a perder de vista.
Nenhum comboio espero hoje, apenas vim para te sentir e dizer-te que após um ano da tua partida, tu continuas presente nas nossas vidas com a mesma força.
O tempo pode passar e continuar a sua tarefa, mas a tua memória permanecerá para sempre entre nós.
A tua coragem e força de viver é para nós o maior orgulho, como eu quero ser para ti.
Margarida Lopes das Neves Marques é uma parte de ti e vai um dia conhecer o Vovô Billy. Ela vai poder olhar para o céu e distinguir no meio do universo a estrelinha que brilha com a mesma intensidade singular que foi a tua vida...



AMO-TE PAI!

quinta-feira, 30 de agosto de 2007

O Artista...


Foto por: Renato Marques - Renato Marques e Grace Snows


Viajava de comboio... como sempre, sentado no seu lugar, alegremente, e pensava na sua vida... havia descoberto há pouco tempo uma daquelas coisas que todos supostamente devemos ter ... só não sabemos bem onde... a sua “veia artística”...

Satisfeito da vida tinha corrido a contar a toda a gente da sua descoberta... mas logo o seu médico o avisou: “amigo, isso é mas é uma variz e o melhor é secar”...

Secar?! Não ficara nada satisfeito com a resposta... e agora?! A sua “veia artística”?! Não podia acabar assim... assim... seca, abandonada... sozinha... e triste...Nem pensar! - disse logo para si próprio colocando um ar autoritário - mas o médico repercutiu... “Oh homem dedique-se mas é à pintura... ou coisa assim”...

Este seu médico era um verdadeiro génio, um iluminado... e não é que foi mesmo isso que ele fez...

Aquilo lá no prédio onde morava ficou a parecer uma residência de artistas... ah pois!! Que ele não é o único, nem pensar!... o Armando, o seu vizinho de baixo, esse também está no ramo... aliás, acho que, na verdade, esse foi o seu grande impulsionador... não por invejas que ele não sofre disso... mas é verdade que adorava ficar a ouvi-lo na porta do prédio aos domingos à tarde a contar as suas histórias de artista... claro está... enquanto lavava o carro...


Mas, a verdade verdadinha é que o Armando era um pouco mais artista do que ele... admitia para si mesmo – “...mas eu ainda estou a começar, ele não... já anda nisto aos anos...”... para terem uma ideia, vejam lá que ele até esteve envolvido na fundação da casa do artista... aliás, segundo ele conta (não sei se é verdade ou não...) a fachada do 1º andar foi toda dele... assentou o tijolinho todo... e ainda fez o reboco... é um verdadeiro Mestre... mas não desses Mestres da têvê... nada disso... um Mestre a sério... tipo aqueles do Karaté... só que o fato de macaco dele não tem é cinto... mas também não precisa... que com a barriga que ele tem não lhe cai de certeza... mas se tivesse cinto... era preto... ah pois era... que ele não é homem de se ficar por menos... ah pois não... ainda no outro dia por causa da lavagem do carro no passeio em frente do prédio abriu a cabeça ao otário do Fonseca do 3º andar com um paralelo da calçada... bem feito... quem o manda armar-se aos cucos?!


Mas pronto... lá ia ele... pensando, falando sozinho, imaginando que um qualquer dia destes faria uma exposição “a dois”... ele e o Armando... um reboca e outro pinta... e para si pensou mais uma vez – “...vai ficar cá uma Obra...Prima... de artistas...”

sábado, 25 de agosto de 2007

"Apanhar o Comboio": o plano




Estava cansada. Farta de comboios, de viagens, de partidas e chegadas, sem conseguir chegar a lado nenhum. Sem ninguém de quem se despedir nem nenhuns braços onde regressar. Cansada daquela rotina, cansada da sua vida, cansada... Seus olhos fecharam-se enquanto, perdida nestes seus pensamentos, olhava para a paisagem lá fora que ia ficando para trás. Pensou em como seria bom se, tal como na paisagem que via momentos antes, também os seus problemas, ilusões e desilusões pudessem ficar para trás...

Ana havia adormecido. Sentia-se aliviada pois não aguentava mais aquele interrogatório. Não aguentava pois ela não conseguia mentir à sua melhor amiga, mas também não lhe podia contar a verdade, não lhe podia dizer tudo o que tinha feito nos últimos meses e não lhe podia dizer o que estava prestes a passar. Saiu do compartimento tentando não acordar a amiga. Todos dormiam, menos ela e mais seis pessoas. Seis homens. Talvez ainda um outro estivesse também acordado. Mas duvidava. Ele nunca fora de noitadas e quando adormecia nem o barulho do comboio o acordava. Irónico...


Percorreu o estreito corredor da carruagem até ao bar e a cada passo que dava lembrava-se de como tudo aconteceu até ao momento em que se encontrava, todos os comboios que tinha apanhado, toda a preparação. O seu plano de vingança havia começado no manhã em que abriu o jornal e viu a fotografia de C. e a manchete que o anunciava assassinado em sua casa com brutalidade. Percebeu tudo quando viu Manuel na recepção do hotel... Nesse mesmo dia apanhou um avião para Roma, onde ficou em casa de um amigo durante um mês, planeando a melhor forma de se vingar... e hoje, após seis meses de preparação, tudo iria terminar.

terça-feira, 21 de agosto de 2007

Pequenas... GRANDES coisas


Foto por: Autor Desconhecido


Naquele dia estava ele a pensar em fazer grandes viagens... planeando e ponderando tudo ao ínfimo pormenor como era seu habito, apesar de que, no final de contas, as coisas nem sempre saírem como planeadas... mas mesmo assim ele gostava daquilo... daquele trabalho de cálculo mental, julgando e ponderando as hipóteses... vendo e revendo... possíveis ou prováveis soluções... fazia parte da sua personalidade “arrumadinha” e “desarrumadinha” ao mesmo tempo... ele era assim mesmo... um falso desorganizado ou um organizado pontualmente desarrumado... não sei bem como o classificar... ninguém sabia... nem ele próprio...

Sem saber muito bem porquê tinha comprado um bilhete... uma viagem pequenina... de 1 ou 2 paragens apenas... nem sabia muito bem porquê... era um gesto assim como quem compra uma viagem individual de Metro mas tendo passe para o mês inteiro... só para o caso de um dia vir a ser necessária... de estar precavido... era assim que ele era...

Na estação estava uma mulher, não era muito velha, mas tinha um ar pesado e cansado de quem carrega com o peso de poucos anos de idade mas de muitos de trabalho... já se tinham cruzado outras vezes, eram “conhecidos”, mas pouco... era estrangeira... ou pelo menos tinha “ares” disso... tinha uma pele morena que não era comum por aquelas paragens e já a tinha ouvido falar um dialecto pouco familiar... o seu semblante era quase sempre o mesmo... um meio-sorriso...

E ele lá continuava a contar as suas histórias e a conversar animadamente e “pelos cotovelos” como era seu timbre com a sua esposa... era essa outra característica dele... falava, falava sem parar... apesar dos amigos lhe reconhecerem qualidades como bom “ouvinte”... havia alturas que a sua vontade de falar, principalmente com a sua esposa, era tanta que parecia que não a via há séculos... e, no entanto, tinham estado apenas afastados por apenas algumas horas ou minutos...
Conversavam sobre a tal mulher... a que estava na estação juntamente com eles... comentavam qualquer coisa acerca dela...

Levantaram-se os dois e caminharam para junto dela... abordaram-na de forma simpática, tentando comunicar com ela... tiraram do bolso o bilhete que tinham comprado... o tal... e perguntaram-lhe se ela estaria interessada em ficar com ele... sucedeu o inesperado... os olhos dela brilharam... brilharam como brilham os olhos de uma criança na noite de Natal... o seu sorriso abriu-se iluminando-lhe o rosto cansado como se lhe tivessem aberto uma janela para entrar o sol da manhã... e foi com esse sorriso e brilho nos olhos que ele jamais esquecerá que ela agradeceu... agradeceu a ambos por aquele bilhete como se fosse o maior prémio que recebera na vida... e seguiu o seu caminho...

Visivelmente emocionado com aquela demonstração de gratidão por algo que para ele parecia tão pouco... tão “insignificante”... nada disse, seguiu também o seu caminho pensando... pensando... no valor... das pequenas coisas...

quinta-feira, 16 de agosto de 2007

"Apanhar o Comboio": o Louco


*Foto por Ricardo Costa



O Ibiza levara-o até Coimbra. Rafaela ficara sozinha num hotel, Hotel D. Inês. Ela iria pelo menos passar lá a noite seguinte, por isso decidiu seguir o homem do Ibiza. Passou o dia a segui-lo, esperando a melhor oportunidade para o abordar e imaginando o que fazer com ele. Seguiu-o até casa. Percebendo que não havia ninguém na rua, atacou-o, encostando-lhe um canivete ao pescoço e tapando-lhe a boca com um pano.
- Ouça com atenção, se não quer que aconteça nada a si nem à Rafaela.
C. tentou protestar algo mas o pano na boca não o deixava expressar-se. Manuel continuou.
- Eu vou dizer números de andares e quando acertar no seu vai fazer-me sinal. Está bem?
C. fez sinal que sim com a cabeça, enquanto Manuel lhe tirava a chave da mão e empurrava C. para dentro.
- Primeiro. Segundo. Terceiro. Quarto.
C. murmurou qualquer coisa e Manuel empurrou-o para o elevador, tirando-lhe o pano da boca e carregando no botão do 4.º andar.
- Oiça bem. Se aparecer alguém e você fizer alguma coisa, eu não hesito em manter ninguém. Percebeu? Agora diga-me qual é o apartamento..
- 4.º dto - disse C., em voz trémula, francamente assustado com o olhar daquele homem.
O elevador parou. Manuel empurrou C., espreitando se havia alguém. Abriu a porta do apartamento e os dois entraram.
- Ah! Enfim sós. Agora, sim, podemos conversar calmamente sobre algo que temos em comum e que eu não gosto de partilhar. De onde conhece a Rafaela?
- Mas qual Rafaela? Eu não conheço nenhuma Rafaela! - disse C. sem perceber o que se estava a passar.
- Não brinque comigo!
- Já lhe disse que não conheço nenhuma Rafaela!
- Até quando é que ela vai ficar em Coimbra?
- Mas ela quem? Oiça, eu não sei de quem é que está a falar!
Manuel sentiu um acesso de raiva. Aquele cretino precisava de pagar por se ter metido com a mulher dele.
- Onde é que você a conheceu? Já se conheciam? Já tinham isto tudo planeado, era? Há quanto tempo é que tinham isto planeado?
- Mas isto o quê?? Eu não percebo nada do que está a dizer!
Enfurecido com a ideia de que Rafaela o tinha deixado por aquele homem e encolerizado pelo facto de ele não responder às suas perguntas, Manuel agarrou no primeiro objecto que lhe veio à mão e desferiu um golpe certeiro sobre o crâneo de C. Depois, cego pelo ódio, agarrou no canivete e começou a desferir golpes sobre o rosto de C., desfigurando-o.
Quando terminou sentiu-se aliviado e em paz. Procurou a cozinha. Preparou uma refeição e sentou-se à mesa a jantar. Estava faminto. epois agarrou no telemóvel e ligou para o Hotel D. Inês.
- Boa noite. Gostaria de falar com a Doutora Rafaela Santos Silva, por favor.
- Só um momento, deixe-me verificar o número do quarto. Vou passar a chamada.
Depois de dois toques de chamada, ouviu-se uma voz feminina do outro lado da linha. Manuel desligou. Rafaela permanecia no hotel.
Saiu do apartamento tranquilamente e conduziu de volta a Coimbra. Pensou em confrontar Rafaela mas já era demasiado tarde. Fá-lo-ia de manhã.

Esperança...

Foto por: F.Luis

Sentado naquele banco da Gare do Oriente pensava... quando será que chega o meu comboio?! Será que ainda tenho que esperar muito?!... Não posso!... Não consigo!... Preciso de apanhar o comboio... mas a verdade é que o receio de não apanhar o comboio certo era mais que muito...
Então, e atento a todas as informações... esperava... esperava... por vezes quase desesperava, mas logo recuperava a lucidez e acreditava que a hora do seu comboio iria por fim chegar.
A espaços metia conversa com este ou aquele passageiro que saíam e entravam de outros comboios que circulavam em outras linhas... também ele já pensara em diversos momentos mudar de linha... procurar um outro comboio que o levasse a outro destino, mas infelizmente o bilhete era, por ora, demasiado dispendioso e a verdade é que também lhe custava a largar definitivamente os comboios a que estava habituado e que eram a sua paixão... mas neste momento da sua vida... ele estava de peito aberto ao mundo... todas as opções pareciam fazer sentido desde que o fizessem feliz... era mesmo isso... a verdade era apenas essa... ele procurava a FELICIDADE... difícil poderão pensar... mas nem tanto... é difícil ser feliz quando se acha que para ser FELIZ é preciso ter o mundo no bolso... mas para ele a felicidade constrói-se em pequenos gestos... em movimentos inesperados... coisas que se sentem... algumas para as quais nem sequer existem palavras que as definam...Outras vezes eram os passageiros e outros transeuntes que, ao olharem para ele, ali, sentado, à espera... metiam conversa com ele... tentavam saber qual o comboio que estava à espera... alguns deles iam-lhe dando informações adicionais... as quais agradecia mas que, na verdade, não serviam de muito mais do que consolo e alimento de uma esperança que por sua vontade não vai morrer nunca... porque quando a esperança é Amor... e Amor é felicidade... e a felicidade não é algo que se possa deixar simplesmente escoar, escorrendo por entre os dedos como um punhado de areia fina... por isso ali estava... e continuava... aos olhos de alguns, possivelmente a PERDER tempo... aos seus, a absorver cada segundo que a vida tinha para lhe oferecer como um sedento por água sorve as gotas de orvalho de uma folha... e lhe sabem a mel...

sexta-feira, 10 de agosto de 2007

Olá

A propósito de um grande concerto ontem no Casino Estoril, de um encontro imediato na hora do regresso a casa... e claro, comboios

Nunca É Tarde Para Se Ter Uma Infância Feliz

A gente já não sabe o que há-de fazer com a lua

Gerou-se um curto-circuito no canal telepático

E a caverna clandestina por detrás da cascata

Onde os amantes se entregavam à eternidade

Hoje não passa dum moderno armazém de sucata
Existem mil produtos para encher o vazio

Criámos computadores para ampliar a memória

E todos nós temos disfarces para aumentar a confusão

Só não sabemos como fazer o amor durar

O grande enigma continua a dar-nos cabo do coração

"Olá, a que horas parte o teu comboio?

O meu é às cinco e trinta e três

Ainda falta um bom bocado,

Queres contar-me a tua história?

Espera, deixa-me adivinhar,

Vais recomeçar noutro lado...

Trazes escrito na bagagem

Que a coisa aqui não deu...

Quanto a mim, também me sinto um pouco desenraízado... "

Também o amor se adapta às leis da economia

Investe-se a curto prazo e reduz-se a energia

E quando o barco vai ao fundo ninguém quer ser culpado

Mas nunca é tarde para se ter uma infância feliz

O cavaleiro solitário ainda sonha acordado

AIÔ - AIÔ - AIÔ - AAAAAHHH!

AIÔ - AIÔ - AIÔ - AAAAAHHH!

AIÔ - AIÔ - AIÔ - AAAAAHHH!

AIÔ - AIÔ - AIÔ - AAAAAHHH!

terça-feira, 7 de agosto de 2007

O Embuste?!?




Cada um no seu lugar... frente-a-frente... lá circulavam à velocidade da carruagem os transportava. Eram apenas dois amigos... antigos colegas de trabalho e companheiros de outras desventuras e de outras vidas, que haviam descoberto tardiamente a sua amizade, como quase sempre se descobrem estas coisas, numa altura difícil para ambos.

Mas quem é que tem vida fácil nos tempos que correm... Porém, estavam bem melhores naquele momento, e nesse preciso dia em que após mais um dia de trabalho árduo, punham, como habitualmente, a conversa em dia... à mistura com a arrumação do trabalho do dia e a preparação da agenda para o dia seguinte.

O tema de conversa era o que circulava na boca do mundo por esses dias... uma menina desaparecera... teria sido levada por alguém da casa onde os seus pais passavam umas relaxantes férias. Os seus pais tinham acabado de dar uma entrevista na qual mostravam toda a sua mágoa com a situação... Será?! – disse ele para ela... Não sejas parvo! – respondeu ela de pronto... afirmação à qual ele apenas respondeu mostrando a sua duvida e suspeição, dizendo - Não sei não! A mim essa história parece-me muitíssimo mal contada e os pais parecem muito suspeitos em tudo isso...

Retorquindo mais uma vez, e continuando com um ar de choque, ela quase lhe bateu afirmando - coitados destes pais, já viste?!? Numa situação destas, lavados em lágrimas, fartos de procurar pela filha e tu ainda achas que eles são culpados! – Ele calou-se... mas apenas por alguns momentos... e disse – Ok... está bem... não nos vamos chatear com esta conversa... mas “escreve ai” na tua agenda que hoje... eu te disse isto... a ver vamos...

Visivelmente perturbada pela persistência do amigo em abordar aquele assunto tão melindroso e que tanto estava a chocar e a apaixonar a opinião publica pelo mundo fora daquela forma aparentemente tão fria e até cruel... ela mudou de assunto... e ficou a pensar consigo própria como é que ele poderia pensar daquela forma...

Alguns dias se passaram... algumas conversas também foram e voltaram... e o assunto sempre andou meio pendente mas sempre de certa forma presente... a espaços e à medida que os acontecimentos se iam precipitando o amigo lá lhe lembrava com alguma ironia à mistura, o que a deixava fora de sí... “olha... lá foram os gajos (referindo-se aos pais da menina desaparecida) passear para Espanha e Marrocos... devem andar atrás dela montados num camelo que é para ser mais fácil de achar... um dia destes vão à procura dela também para o Brasil e para a Tailândia ou Republica Dominicana, podem tê-la levado para lá... ainda bem que têm o dinheirito da Fundação que criaram para “gerir” os donativos que os otários vão largando... se em vez de darem donativos e espalharem cartazes e mails pela net essa gente pegasse mas era numa pá... vai-se a ver ainda está debaixo dalguma palmeira no jardim...” e a cada citação do tipo ela ficava cada vez mais enervada com o assunto e seguia-se um período em que fazia uma espécie de abstemia de conversas sobre o assunto...

Entretanto as suas vidas tomaram rumos diferentes... e como deixaram de apanhar o comboio nos mesmos horários as conversas foram-se tornando cada vez menos frequentes... mas ele lá continua, secretamente, à espera do dia em que a historia terá uma resolução... ansioso para saber qual dos dois engole o sapo... ou será o elefante...



P.S.: Advertem-se os leitores para o facto de qualquer semelhança deste texto com a realidade ser pura coincidência... ou não...

quarta-feira, 1 de agosto de 2007

Pensamento: Linhas (des)cruzadas

Um dia ela ganhou coragem, depois de viajar sozinha sempre o mesmo trajecto, e saiu do comboio. Dirigiu-se à bilheteira e pediu: "1 bilhete tipo lotaria, se faz favor. Não importa para onde. Dê-me apenas um bilhete. Só ida."
Ele, finalmente pensou em entrar no comboio dela. Entrou no comboio que ela apanhava todas as noites, na carruagem que ela escolhia fixa... mas não a encontrou.
Ela partia de sorriso nos lábios, recordando com ternura o passado e esperançosa quanto a um futuro que, no matter what, lhe parecia sorrir, se ela sorrisse também...

sábado, 28 de julho de 2007

Caminhos-de-Ferro da Literatura

Por um tempo amaciado, de degelo, de fins de Novembro, cerca das nove da manhã, o comboio do caminho-de-ferro Petersburgo-Varsóvia aproximava-se a todo o vapor de S. Petersburgo. Estava tão húmido e havia tanto nevoeiro que amanhecia a custo; era difícil distinguir alguma coisa das janelas da carruagem a mais de dez passos à esquerda e à direita da linha. Entre os passageiros, alguns voltavam do estrangeiro; mas o grosso dos viajantes, gente simples e de trabalho, enchia a terceira classe e viajava de lugares não muito distantes. Como de costume, toda a gente estava cansada, de olhos pesados ao fim da noite, com frio, todos os rostos de um pálido amarelado, da mesma cor da neblina.
Numa das carruagens de terceira classe calhou ficarem frente a frente do lado da janela, desde o amanhecer, dois passageiros - ambos jovens, ambos quase sem bagagem, ambos com roupa longe de ser elegante, ambos dotados de notáveis fisionomias e ambos com vontade de, finalmente, meterem conversa um com o outro.


in O Idiota, de Fiódor Dostoiévski (1868)

terça-feira, 24 de julho de 2007

Hoje não há comboios


Foto por: rudolfo lopes


Parado na plataforma da estação olhava em volta como quem busca e não acha... e olhando de 10 em 10 segundos para o relógio lá continuava... de malas na mão, como se estivesse preparado para entrar no comboio a qualquer segundo... só que... não havia qualquer comboio... as linhas estavam desertas... imóveis... isentas de quaisquer vibrações... e não se ouvia qualquer som que anunciasse uma qualquer chegada...
Era um dia estranho... quente... abafado... e o suor escorria-lhe pela face em pequenas gotas que se formavam na sua testa e que desaguavam no seu queixo onde se lançavam em queda-livre até ao chão ardente da plataforma...
Um brisa tórrida fazia-se sentir de quando em vez... mas apenas para nos lembrar que o mundo não estava parado... exausto largou as malas... e voltou a olhar o relógio... olhou novamente em volta... ninguém... nem vivalma no horizonte mais longínquo até a vista pode alcançar... A pressa e a ansiedade que demonstrava tinham já dado lugar ao desespero... sentou-se em cima das malas... baixou a cabeça e olhou para o chão... num momento de loucura levantou-se e gritou: - Então, mas hoje não há comboios?! – mas a única resposta que teve foi a do seu próprio eco...

segunda-feira, 23 de julho de 2007

A ver passar comboios...



*Foto por Margarida Araújo


Mais uma vez perdi o comboio. Fiquei a vê-lo passar, de bagagem na mão e com o olhar a segui-lo, vendo-o partir. Vi toda a gente sair, uns apressados, outros de olhar vagueante, tentando localizar-se ou procurar alguém que os devia esperar. Depois deixei toda a gente passar. Uns igualmente apressados, com medo de ficarem para trás ou não terem lugar, outros a quererem prolongar a despedida, com abraços e beijos e mãos que à força se desenlaçam. E eu ali, junto à porta... De olhar fixo no interior da carruagem mas sem ver nada. O sinaleiro olhou para mim umas quantas vezes, vendo-me parada à porta, de malas na mão. E entretanto, o comboio lá partiu... Mais um que se foi, não tendo eu sido capaz de abandonar a estação e deixar tudo para trás. Fiquei ali, a olhar mais aquele que deixei fugir... Curiosa a vida, não é? Há tão pouco tempo (será?) não conseguia deixá-lo. Ali ficava, à janela, olhando lá para fora, passando todas as paragens e adiando a minha saída. Foi assim durante muito tempo (ou assim me pareceu) até que me forçaram a sair porque o comboio havia terminado a sua marcha e aqui fiquei... mas agora não consigo mais continuar viagem, mesmo sabendo que o meu lugar não é aqui e que chegou a hora de, de novo, partir.

sexta-feira, 20 de julho de 2007

The Brake to Reality



Sentado à janela da carruagem em que seguia rumo a um destino desconhecido entretinha-se a contar os postes que passavam lá fora à velocidade dos sonhos... sem nada para fazer... se ao menos o ipod funcionasse poderia ouvir musica... não percebia muito bem porquê mas não conseguia ouvir nada... devia estar avariado... não deu importância... alias, esse facto por si só já era extremamente curioso... ele, sempre tão preocupado com tudo... com as suas coisas, com os seus haveres estava estranhamente despreocupado... era como se tudo tivesse perdido a importância... pelo menos tudo o que era material...

Em tempos fora tomado por alguns como uma pessoa muito materialista... e única e exclusivamente preocupada com o seu sucesso, as suas vitórias pessoais, os seus troféus... o seu lucro... o seu dinheiro... o seu status...

Nunca tivera essa noção, alias, discordava inteiramente dela... era apenas alguém que queria ser feliz... que gostava de ter pequenas coisas... chamem-lhe pequenos luxos... talvez... mas luxos que o suor do trabalho pode pagar... para ele tudo se resumia a uma palavra... CONFORTO...


Com o passar do tempo estranhou o silencio que tomara conta daquela carruagem... não se ouvia um único ruído... que estranho – pensou... até vai quase cheio... mas logo retomou a sua contagem de postes... de repente uma súbita travagem... o comboio balançou bruscamente e sentiu-se um comprimir entre carruagem como se de um acordeão se tratasse... finalmente parou... e o pânico instalou-se e tomou conta de todos os passageiros... ou de quase todos... pois, estranhamente... ele ali continuava no seu lugar... calmo e sereno... quase sem dar pelo tumulto que se havia instalado... olhou em volta e viu pessoas a correr por entre os bancos em direcção à frente do comboio.... pareciam gritar... e falar alto... mas ele não os ouvia... era como se tivesse ficado surdo de repente... via o movimento... sentia a atmosfera pesada... mas não sabia o que se passava... ao seu lado passou uma senhora notoriamente abalada que se dirigia em sentido contrário à maioria dos passageiros... já deveria vir na volta... mas o que será que tinha acontecido para a senhora ter aquele olhar pesaroso e abalado... tentou interpela-la... - a senhora desculpe... o que é que passou? – disse num tom calmo e educado... mas não obteve resposta... parecia que a senhora nem o tinha ouvido... provavelmente ia nos seus pensamentos e não reparou que ele se estava a dirigir a ela...

Levantou-se e foi caminhando lenta e calmamente pela carruagem até à saída mais próxima... desceu do comboio... estava um calor abrasador... uma brisa tórrida e com um cheiro calcinado saía por debaixo do comboio e invadia todo o ar... avistava-se um grupo de pessoas reunidas em torno de algo ao fundo... na frente do comboio...Caminhou ao longo da linha e ao longo do comboio aproximando-se das pessoas... reparou que as rodas das carruagens apresentavam um tom brazeado... a travagem pelos vistos tinha sido violenta... ao chegar juntos das pessoas reparou que estava um vulto... algo no chão... junto à linha...seria uma pessoa?!... ou talvez um animal?!... não conseguia observar com certeza... as pessoas não se moviam e teve que contorná-las para saber o que motivava tamanha curiosidade... reparou nuns sapatos e percebeu que era uma pessoa... que lhe teria acontecido?!? Aproximou-se o mais que pôde... espreitou... uma pessoa moveu-se e conseguiu finalmente ver-lhe o rosto... era... ELE PRÓPRIO...

domingo, 15 de julho de 2007

Escolhas




Era noite cerrada... caminhando junto ao muro que dividia a estrada do lago estava ele... mãos nos bolsos... balbuciando-se como quem se embala pelos pensamentos ou por um copo a mais bebido num qualquer bar das redondezas... caminhava sem destino... um ouvido atento conseguiria distinguir um som abafado que as espaços lhe rasgava os lábios e se tornava audível... estava a cantar... ou melhor, a trautear uma velha musica da qual não sabia sequer a letra, nem como lhe tinha aparecido na cabeça... mas simplesmente apetecera-lhe trautea-la acompanhando o ritmos da água que se movia ao sabor das correntes e dos vento. Ao fundo da rua... no escuro do breu notou um vulto do qual apenas se destinguiam algumas linhas de força... era um velho pescador, que ocupava o seu lugar cativo de há muitos anos... nunca ninguém o vira retirar da água coisa alguma que se parecesse com peixe... mas ele lá estava, religiosamente, no seu spot favorito, lançando a linha à água e esperando... esperando... esperando... imóvel, impávido e sereno ali permanecia horas a fio... sem sequer dizer uma palavra. Ao passar por ele o homem trauteou um pouco mais alto... e ouviu de imediato um “XIIUUUU!!”... o que foi Mestre? – respondeu o homem. Não me diga que lhe estou a espantar o peixe?! – disse num tom de alguma troça. Mas apesar de ter permanecido ali por alguns segundos não obteve resposta alguma... Decidiu continuar o seu caminho, mas ao dar o primeiro passo afastando-se do local, ouviu finalmente a resposta do velho pescador... Não! Não me está a espantar o peixe! – disse ele com uma voz algo rude... mas está a retirar-me aquilo que realmente me faz vir aqui – continuou... toda a gente sabe que aqui não há peixe nenhum... ou se há, é demasiado esperto porque nunca ninguém o pescou... aquilo que aqui procuro é apenas e só a minha PAZ... sou ateu e a pescaria é como se fosse a minha religião... este local é a minha igreja... e já notou o belo templo que eu tenho!? Aqui consigo a paz de espirito que tanto busco, falo comigo mesmo, reflicto, tomo decisões... falo com o meu Deus... como o farnel que trago como se tomasse a hóstia e bebesse o vinho... seja ele o que for... não preciso de símbolos, as coisas são aquilo que quisermos que sejam... está tudo na nossa cabeça... cada pedra deste lago é como um santo para mim... cada isco que coloco no anzol é como uma oração... e aqui não preciso vir bem vestido e calçado para não ser alvo de falatório ou chacota... neste meu templo pode vir quem quiser, 24h por dia 7 dias por semana, 365 dias por ano... não há horários de missa nem de reza... é tudo como quisermos que seja...Ao ouvir todo esse discurso o homem reagiu de novo em tom de gozo e retorquiu – mas que Deus é esse o seu que não recompensa com um peixinho apesar de tanta dedicação... Realmente o senhor não percebeu nada daquilo que lhe disse... é igual a todos os outros... faz porque procura ser recompensado... e que recompensas dá Deus a quem vai à Missa todos os Domingos?! A vida eterna?! O meu Deus pratica um milagre todos os dias que aqui venho... tira-me o peso das preocupações, alivia-me a alma, ajuda-me nas dúvidas e conduz-me às respostas... é tudo o que preciso... “para que quero eu um bilhete de comboio se nem sequer sei onde fica a estação nem para que lugar quero ir?!?!...”

quinta-feira, 12 de julho de 2007

A Perseguição


...correndo pela rua lá ia ele... sôfrego... alguém o perseguia... mas quem?! Nem ele sabia dizer... só sabia que se sentia vigiado a cada esquina... alguém o espiava e registava cada movimento seu por entre as portadas fechadas das janelas daquela rua... por momentos parava... não aguentava mais... e olhava em volta... ninguém... a cidade parecia deserta... não havia vivalma... ninguém a quem pudesse pedir ajuda... na boca um sabor amargo e uma secura tal que parecia nem conseguir engolir a saliva... mas também não havia líquido algum... a garganta estava igualmente ressequida como a areia de um deserto, tão deserto como aquela rua... seria possível?! Onde estaria toda a gente?! Sentiu-se de novo observado... ouvir ao longe um som de passos... era volta de voltar a fugir... mas de quem?! E porquê?! O que teria feito?! Não se recordava de nada... nem do seu próprio nome... não sabia onde morava... onde estava e quem o perseguia... o seu corpo movia-se com um autómato em direcção à salvação... à fuga...
Estoirado... derreado... parou... caiu... com a face encostada às pedras frias da calçada sentiu uma gota de suor deslizar desde a sua testa passando junto ao seu olho entreaberto e cair, escorrendo pelo nariz... quase conseguiu ouvir essa gota a cair no chão... não tinha mais forças... não conseguia mover um único músculo... tinha atingido o seu limite físico... era agora que ia ser apanhado... mas nem os olhos conseguia manter abertos para ver quem o perseguia... vislumbrou apenas uma sombra... um vulto... a aproximar-se lenta e vagarosamente... estendendo-lhe um braço... tocou-lhe... ACORDOU!! NUM PULO!! Respiração bloqueada pelo susto... - Bom dia... são horas de acordar! Já estás levantado? – ouviu... olhou em volta ainda em apneia... e à medida que foi conseguindo finalmente respirar percebeu que estava no seu quarto... ensopado em suor... foi tudo um pesadelo - pensou... eram 7 da manhã e estava atrasado para apanhar o comboio...

segunda-feira, 2 de julho de 2007

Strawberry Gum



Foto por: Marco Coelho


...telefone a tocar, sinal de alarme... deitado no sofá acorda em sobressalto e corre em direcção a lado nenhum... pára! Olha em volta... e pensa... que faço eu aqui? Volta-se e corre de novo em direcção ao som cada vez mais estridente do telefone mas não o acha... não o encontra em parte nenhuma e à medida que o som aumenta mais se confunde e parece agora vir de todos os lugares... de todas as divisões da casa... procura e procura... com rapidez, com ânsia... procura até nos lugares mais estúpidos... gavetas da cozinhas, armário dos sapatos, no móvel da tv ou no meio dos CD... e nada... está desesperado... e o toque de súbito pára... alguém desligou... cansou-se de esperar que ele atendesse... será que vai voltar a ligar - pensa ele com os seus botões... e se ligar já?!? Ainda nem sequer achei o telefone... onde será que ele está?... como vou agora procurar? Se não o achei enquanto estava a tocar como o vou achar agora?!? Já sei! – disse!
Desceu vertiginosamente as escadas do prédio em direcção à rua... saiu porta fora e atravessou a estrada sem sequer olhar... por sorte ou por alguma conjuntura astrológica favorável não vinha a passar nenhum carro... dirigiu-se para a cabina telefónica mais próxima, ou pelo menos a mais próxima que conhecia, a da estação... meteu a mão ao bolso em busca de moedas e... o telefone... que estupidez!! Que idiota que eu sou!! – pensou em voz alta... como não pensei logo que estava no bolso... como não o senti enquanto procurava... número privado... que M*****, detesto números privados... como vou saber quem me ligou assim... ligo para o Sr. Privado?!? – disse em total desespero... sentou-se nos degraus de uma entrada de um prédio e agarrado ao telefone pensou – ao menos já sei onde está... se voltarem a ligar já posso atender... mas, e se não voltarem a ligar?! O melhor é ir para casa...



Levantou-se e sentiu-se preso... preso ao degrau onde se sentara... investiu mais uma vez na tentativa de se levantar... conseguiu... olhou para o degrau... NADA!! Como pode ser?? – pensou... que raio se passa aqui?! Torceu o tronco na tentativa de ver o que se passava... e nas suas calças encontrou... uma pastilha elástica... pelo cheiro... era morango... o seu aroma favorito...

domingo, 24 de junho de 2007

"Apanhar o Comboio": encontros


*Foto por Tiago Gonçalves

- Não, não fiquei em casa dele. – respondeu Rafaela sem conseguir disfarçar um suspiro ou esconder o seu olhar triste e desiludido. – Ele levou-me para Coimbra, deixou-me à porta do Hotel Dona Inês e combinámos jantar na Avenida, no dia seguinte, às 21h. Mas...
- Mas?? Que se passou? – interrompeu-a Ana sem conseguir controlar a sua ansiedade.
- Mas ele não chegou a aparecer. Sabes, até me ri da minha estupidez. Ficar horas num restaurante à espera de um desconhecido. Não era isso que eu tinha programado e foi exactamente o que acabei por fazer. Horas à espera dele.
- Mas ele não te disse nada? Não explicou porque não apareceu?
- Como? Eu disse-lhe que me chamava Beatriz porque não queria que ele soubesse nada de mim, para que pudesse sair da vida dele da mesma forma que entrei e ele a mesma coisa! Nem sequer números de telefone trocámos! Eu estava, realmente, em vantagem! Sabia onde ele morava. Mas, como é óbvio, não lhe fui bater à porta! Não, nunca mais o vi... em vez dele apareceu outra pessoa.


Manuel acordou de manhã, na marginal, com os primeiros raios de sol e o barulho de algumas pessoas que corriam ao longo da marginal. Havia adormecido no carro. E se ela tinha saído sem ele dar por isso? Não a podia perder de vista! Resolveu esperar dentro do carro. Ainda era muito cedo e o homem com quem a vira deveria estar ainda lá dentro. O Ibiza preto continuava estacionado à porta do prédio onde haviam entrado os dois na noite anterior. Esperou pacientemente durante algumas horas até que o viu sair. Pensou em segui-lo, mas depois pensou que Rafaela ainda poderia estar lá dentro e não a poderia deixar escapar. Então, resolveu permanecer no carro. Poucos minutos depois, o homem moreno passava com uma rosa branca na mão e um saco de pastelaria. Caramba! Ele ia dar-lhe a volta! Rosas brancas... as suas flores preferidas juntamente com as tulipas brancas. Mas se ele levava uma rosa era porque ela lá havia passado a noite e ainda lá estava. Esperou com impaciência. Quase uma hora depois voltou a ver o homem sair de casa. Sozinho. Pensou em tentar entrar no prédio e surpreendê-la mas não tinha conseguido perceber em que apartamento eles estavam e era demasiado arriscado. Não queria fazer nenhum escândalo e o homem com quem ela estava era nitidamente mais forte do que ele. Acabou por continuar a sua espera, contrariado. O homem regressou passada meia hora. Passou uma hora. Duas horas. Três horas. E nada da Rafaela. Os dois estavam dentro de casa e não havia meio de saírem. Manuel encolerizava-se com o que ia imaginando que Rafaela pudesse estar a fazer com aquele homem. Ela era só dele! Nenhum outro homem poderia tocá-la! Entretanto, a meio destes seus pensamentos, viu a porta do prédio abrir-se e Rafaela e C. saírem de mãos dadas. Ela parecia feliz, de sorriso aberto, trocando suaves carícias com aquele homem de ar latino. Entraram no carro e Manuel voltou a segui-los, esboçando ideias de vingança contra aquele sujeito, aquele cretino que havia ousado tocá-la.

sexta-feira, 22 de junho de 2007

"Apanhar o Comboio": a partida


*Foto por João Lopes



Quando Manuel chegou a casa, dirigiu-se à sala, sentou-se numa das poltronas e pôs-se a ver televisão, como fazia todos os dias. Passados exactamente noventa segundos depois de se sentar, começou a gritar, como fazia todos os dias:
- Querida! Querida!
Nada... ao contrário do que acontecia todos os dias. Apenas o silêncio. O silêncio que tanto medo lhe causava.
- Queriiiiiida! Queriiiiiida!
Ainda nada.
- Rafaela! Oh, Rafaela! Rafaela! Querida!
Insistiu um bom bocado, como sempre fazia.
Passados cinco minutos sem resposta, levantou-se contrariado e foi buscar um pão à cozinha. Depois, percorreu todas as divisões da casa em busca da sua companheira. Nada da Rafaela. Talvez tivesse ido à loja buscar alguma coisa para o jantar. Tinha fome. Eram quase horas de comer. Voltou à cozinha para espreitar o que Rafaela tinha preparado e estranhou não ver nada no fogão, nenhuma comida feita ou semi-feita. Não era da Rafaela não ter ainda o jantar a preparar. Ela sabia que ele gostava de jantar cedo e fazia sempre tudo para lhe agradar. Na verdade, saiu-lhe a sorte grande quando conheceu a Rafaela. De todas era aquela com que mais ganhava. Ocupou-se dos seus filhos e quase quis ficar também com a guarda da neta. Aliás, só não o fez porque ele não havia revelado grande entusiasmo nisso e ela ficou apreensiva em relação a criar uma criança sozinha. Detestava as lides domésticas mas fazia-lhe tudo em casa e... era uma mina de ouro! Quando se conheceram, ele passava por sérias dificuldades, com os negócios a correrem mal, e foi ela que, primeiro, o sustentou e, depois, tomou as rédeas de tudo e recuperou a empresa. Se não fosse ela, hoje não teria nada. E se ela se fosse embora estava ciente de que perderia muitos clientes. Para juntar a tudo isto, era um excelente troféu para um quarentão exibir, passeando-se com uma miúda que tinha metade da sua idade. O telemóvel tocou, interrompendo-lhe o pensamento. Era a Elisabete. Outra gaja boa como o milho. Quarentona também, mas muito bem conservada. Loura. Ex-modelo. Fácil de levar para a cama como quase todas. Conhecia bem o tipo. Era casada com um empresário que lhe dava tudo menos atenção. Coitada. Precisava de um bom tratamento. E ele sabia e podia dar-lho.
- Elisabete, querida, adivinhaste os meus pensamentos. Cheguei agora a casa e ia ligar-te. Estou exausto. Tive um dia cinzento. A única coisa que me segurou foste tu, a tua lembrança. Pensar em ti dá-me tanta paz...
- O meu marido está a chegar. Tenho de desligar. Liga-me amanhã. Preciso de te ver novamente. – desligou.
Manuel levantou-se e foi até à varanda. Não havia meio de Rafaela chegar. Era estranho. Acendeu um cigarro. Sentiu um arrepio de frio. A noite estava a arrefecer e assustou-se com a ideia de ficar doente. Era um hipocondríaco. Acabou de fumar o seu cigarro dentro de casa e dirigiu-se ao quarto para ir buscar uma camisola de malha. Dirigiu-se ao roupeiro e, ao abri-lo, ficou estagnado. Toda a roupa de Rafaela tinha desaparecido. Correu até à salinha do fundo. A mala de viagem dela também já lá não estava. Rafaela tinha-o deixado! Sentiu-se mal. Começou a ficar com tonturas e sentiu o coração acelerado. Ninguém o deixava! Agarrou no telemóvel e pensou em ligar à irmã. Elas eram muito amigas. Demasiado até. Talvez Rafaela lhe tivesse dito alguma coisa. Quando ia para marcar os números, o telemóvel tocou. No visor apareceu o nome Sofia. “Oh, sorte!”, pensou. “O que quer esta agora?”
- Estou! – atendeu bruscamente.
- Senhor Rebelo Sousa, desculpe estar a ligar-lhe.
- Diga! – respondeu quase num grito.
- É que o Eng.º Tavares ligou a querer confirmar o almoço com a Rafaela, mas ela não atende o telemóvel. Eu vi-a junto à estação antes de ele ligar e era para confirmar se a viagem dela ao Porto foi antecipada.
- Junto à estação? Hã? Hum... Pois. Foi. Foi antecipada. – respondeu atrapalhado mas não querendo dar a perceber o que se passava. – Esse Eng.º é um cretino! Cancele! – e, sem mais, desligou-lhe o telefone.
Amaldiçoou-se e agarrou nas chaves do carro. Talvez não fosse demasiado tarde. Quando chegou à estação e se preparava para sair do carro à procura de Rafaela, viu-a sair do café, rindo-se. Ao lado dela vinha um homem moreno na casa dos trinta. Os dois entraram num Ibiza preto e arrancaram. Manuel apressou-se a ligar o carro e arrancou atrás deles.


Viagem Adiada


Foto por: manuel santos


... ansioso caminhava pela casa de um lado para o outro como quem gasta as solas dos sapatos por vingança de já não ter unhas por roer nas mãos e não ter já a flexibilidade suficiente que lhe permitisse roer também as dos pés... esperava e desesperava pela hora... a hora do tão esperado telefonema que o faria embarcar numa nova viagem... talvez uma viagem importantíssima... pelos menos assim esperava... mas não havia meio daquele telefone tocar... abriu e fechou tantas vezes a tampa estilo concha do seu telefone que até já a mola dava sinais de cansaço e perdera parte da força que sempre a caracterizou... antes até entalava dedos aos mais descuidados, agora... fechava-se lenta e vagarosamente como quem pede ajuda para o fazer...

Passeou-se mais uma vez pela sala nos sapatos novos... ou que o foram, pois os quilómetros que já haviam levado nas últimas horas faziam-nos parecer já semi-novos apesar de terem sido comprados propositadamente para a viagem no dia anterior... queria parecer bem apresentado ao chegar... também tinha comprado roupa nova... um fato muitíssimo elegante e muito ao seu estilo, mas esse não se atrevera sequer a usar, estava estendido em cima da cama, pronto para ser envergado como um cartão de visita... pelo menos era assim que ele pensava... ou pelo menos sempre fora assim que fora induzido a pensar por todos... já a sua mãe dizia... “...veste-te sempre bem meu filho... sai sempre de casa como se fosse para o encontro mais importante da tua vida... nunca sabemos o que a vida nos reserva ao virar da esquina...”. Apesar de ela própria nunca se ter preocupado muito com as aparências, a sua eterna sapiência de mãe levava-lhe a dizer estas coisas desde sempre... e ele foi interiorizando aquilo... como um dogma da sua vida...

Se a sua mãe o visse a fazer aquela figura e com as mãos naquele estado... já não restavam unhas, peles e outros por roer... o nervosismo instalado já o fazia ter vontade de ir à casa de banho de 5 em 5 minutos... coisa que fazia... levando o telefone com ele... que ridículo! – pensava para si próprio...

Finalmente tocou... atendeu sem ouvir sequer o segundo momento sonoro do “ring ring” executivo que tinha como toque, como convém... nada dessas musicas modernas ou toques do Jamba que o pudessem fazer passar vergonha nalgum lugar onde o seu telefone pudesse tocar... mas não disse nada... só ouviu e acenou com a cabeça ao ritmo da informação que ouvia apesar de não ser uma video-chamada... do outro lado alguém desligou no momento em que ele se despedia com a cordialidade que lhe era reconhecida... devido a problemas de agenda o compromisso teria que ser adiado e, consequentemente, a viagem tinha que ser adiada...

Descalçou-se e levou os sapatos na mão até ao quarto onde os colocou na sua caixa... pegou no fato deitado na cama e colocou-o dentro do seu saco próprio para o efeito e pendurou-o no roupeiro para que não se enrugasse... assim estaria tudo perfeito... para voltar a saltar do roupeiro ao ritmo de um novo telefonema...

quinta-feira, 21 de junho de 2007

"Apanhar o Comboio": o começo do fim

*Foto por Hugo Félix


C. mostrou-lhe onde ficava a casa de banho, entregou-lhe uma toalha limpa e disse que ia aproveitar para ir comprar o jornal e deixá-la mais à vontade. Quando voltou encontrou “Beatriz” na sala, enrolada apenas na toalha, de cabelos molhados a escorrerem pequenas gotas que desciam sobre os ombros e costas como uma lágrima que beija a pele e cujo percurso ele ia hipnoticamente seguindo. Não conseguiu disfarçar a atracção que sentia por aquela mulher desconhecida e o seu olhar não se desviava das linhas do seu corpo, admirando igualmente as pernas bem torneadas. A princípio, “Beatriz”, que procurava na mala uma roupa mais confortável, não deu pela sua presença nem o ouviu chegar, uma vez que tinha encontrado uma colectânea de música jazz e a tinha posto a tocar. Mas, de súbito, sentiu-se observada e, sem pensar, sorriu maliciosamente, pensando no que ia fazer. Toda a vida havia sido uma menina bem comportada, primeiro uma estudante aplicada, depois uma profissional empenhada, mais tarde a companheira fiel e dedicada, preocupada mais com o juízo que os outros faziam de si do que em viver a sua vida. Chegara a altura de viver essa vida há tanto parada, vivê-la realmente, experienciando cada momento como quem sorve a última gota de um néctar divino. Seguir os seus instintos. Aventurar-se. Foi assim que, fingindo não se aperceber da presença de C., “Beatriz” deixou a sua toalha cair, revelando a sua nudez. Virou-se lentamente e olhou-o nos olhos. C. não o percebeu pois fixou-se nos seios perfeitos da mulher que tinha à frente. Ela aproximou-se e beijou-o. Foi um beijo electrizante, algo que nenhum dos dois havia alguma vez sentido. “Beatriz” sentiu como se todo o seu corpo fosse invadido por uma sucessão de vagas de calor e energia. Demorou vários minutos, aquele beijo, e “Beatriz” sentiu uma onda de prazer apoderar-se de si como poucas vezes havia sentido num acto sexual. Apenas com um beijo. De corpos unidos, C. conduziu-a até ao quarto, enquanto ela lhe ia tirando a roupa pelo caminho. Possuíram-se de forma selvática e, no final, aninharam-se um no outro em descanso, abraçados, quase fundidos num só, sem trocarem palavra.
- Preciso de um duche. – disse “Beatriz” levantando-se da cama. – Vens? – perguntou-lhe em tom desafiador quando chegou à porta. C. não respondeu. Apenas sorriu e seguiu-a. No duche voltaram a amar-se.

- Tu... tu... Olha, por essa eu não esperava! Aquela da toalha caída no chão... Nem te reconheço! E... como é que ele foi?! Quer dizer... tu sabes! Como é que ele é?
Beatriz sorriu.
- Nem consigo definir. É... foi viciante. O C. é viciante. Um simples beijo com ele é uma explosão de prazer. O teu corpo tem espasmos de prazer! Apenas o facto de ele entrar em ti faz-te entrar em êxtase. Foi viciante... e inesquecível.
- Isso significa que não ficaram por aí? Continuaste a encontrar-te com ele? Carago! Isto de estarmos tanto tempo longe não dá com nada! Conta-me! Estou cada vez mais curiosa com o que aí vem. É que depois do que me contas eu já nem sei o que pensar ou o que esperar! Voltaram a encontrar-se? Não ficaste em casa dele outra vez, ficaste?