terça-feira, 22 de julho de 2008

Esboço de um Conto de Fadas Mal Contado

*Foto do blog: segredoscontados.nireblog.com



Era uma vez uma linda princesa... bem, não era de sangue azul e a monarquia há muito estava extinta; também não era propriamente bonita, não era alta, loura, de olhos azuis e de medidas 86-60-86 - era pequenina, frágil, cabelos acobreados e olhos de azeitona. Mas queria sentir-se como uma princesa dos contos de fada que ouvia em criança e que a faziam sonhar com castelos e príncipes encantados de armadura reluzente, montados em lindos corcéis brancos. Queria viver um final feliz para sempre.



Mas a jovem-mulher-que-não-era-princesa não vislumbrava castelos, somente fortalezas. Encontrava-se rodeada por prédios degradados e sem dinheiro para a renda. Não tinha aias a quem suspirar os seus desamores. Convivia com bruxas más que se intrometiam na sua vida pessoal e lhe quebravam as forças.



Afinal, talvez esta jovem mulher que sonhara em ser princesa fosse a gata borralheira, uma vez que passava os dias a limpar a casa e a passar a roupa. Nesse caso, tornar-se-ia Cinderela assim que achasse o seu sapatinho de cristal. No entanto, as sapatarias não tinham o número 34 para adulto.



Pensou, então, em cair num sono profundo, qual Bela Adormecida, esperando despertar com o beijo do amor verdadeiro. Assim, fechou as cortinas e tomou uma série de ansiolíticos e calmantes. Mesmo assim, despertou com uma voz bem grossa e assertiva - o patrão que gritava: «Não há nada que se coma nesta casa!!»



A jovem mulher aspirante a princesa suspirou e lentamente caía em desalento. O príncipe encantado transformara-se num ogre, de olhos raiados de sangue, voz grossa e assustadora e o sapo beijado mas recusado devido à pele esverdeada e toque viscoso transformara-se em príncipe depois de ela o ter mandado embora e vivia feliz para sempre com uma princesa que se transformara em rã.



Esperava ainda o corcel branco, veículo de fuga para um mundo de fantasia, onde ela pudesse encontrar uma torre onde se fechasse em clausura, qual Rapunzel, e onde vivesse o resto dos seus dias olhando o horizonte. Encontrou o seu corcel. Não era branco nem relinchava, nem tinha uma sedosa crina que pudesse afagar. Era um monstro cinzento de metal que fazia um barulho estrondoso e andava sobre carris. Entrou na locomotiva e expulsou o condutor. Fechou as portas, puxou a alavanca e partiu a todo o vapor, descarrilando o comboio apenas alguns metros à frente. Partira, finalmente, para o paraíso dos seus sonhos.