sexta-feira, 22 de junho de 2007

Viagem Adiada


Foto por: manuel santos


... ansioso caminhava pela casa de um lado para o outro como quem gasta as solas dos sapatos por vingança de já não ter unhas por roer nas mãos e não ter já a flexibilidade suficiente que lhe permitisse roer também as dos pés... esperava e desesperava pela hora... a hora do tão esperado telefonema que o faria embarcar numa nova viagem... talvez uma viagem importantíssima... pelos menos assim esperava... mas não havia meio daquele telefone tocar... abriu e fechou tantas vezes a tampa estilo concha do seu telefone que até já a mola dava sinais de cansaço e perdera parte da força que sempre a caracterizou... antes até entalava dedos aos mais descuidados, agora... fechava-se lenta e vagarosamente como quem pede ajuda para o fazer...

Passeou-se mais uma vez pela sala nos sapatos novos... ou que o foram, pois os quilómetros que já haviam levado nas últimas horas faziam-nos parecer já semi-novos apesar de terem sido comprados propositadamente para a viagem no dia anterior... queria parecer bem apresentado ao chegar... também tinha comprado roupa nova... um fato muitíssimo elegante e muito ao seu estilo, mas esse não se atrevera sequer a usar, estava estendido em cima da cama, pronto para ser envergado como um cartão de visita... pelo menos era assim que ele pensava... ou pelo menos sempre fora assim que fora induzido a pensar por todos... já a sua mãe dizia... “...veste-te sempre bem meu filho... sai sempre de casa como se fosse para o encontro mais importante da tua vida... nunca sabemos o que a vida nos reserva ao virar da esquina...”. Apesar de ela própria nunca se ter preocupado muito com as aparências, a sua eterna sapiência de mãe levava-lhe a dizer estas coisas desde sempre... e ele foi interiorizando aquilo... como um dogma da sua vida...

Se a sua mãe o visse a fazer aquela figura e com as mãos naquele estado... já não restavam unhas, peles e outros por roer... o nervosismo instalado já o fazia ter vontade de ir à casa de banho de 5 em 5 minutos... coisa que fazia... levando o telefone com ele... que ridículo! – pensava para si próprio...

Finalmente tocou... atendeu sem ouvir sequer o segundo momento sonoro do “ring ring” executivo que tinha como toque, como convém... nada dessas musicas modernas ou toques do Jamba que o pudessem fazer passar vergonha nalgum lugar onde o seu telefone pudesse tocar... mas não disse nada... só ouviu e acenou com a cabeça ao ritmo da informação que ouvia apesar de não ser uma video-chamada... do outro lado alguém desligou no momento em que ele se despedia com a cordialidade que lhe era reconhecida... devido a problemas de agenda o compromisso teria que ser adiado e, consequentemente, a viagem tinha que ser adiada...

Descalçou-se e levou os sapatos na mão até ao quarto onde os colocou na sua caixa... pegou no fato deitado na cama e colocou-o dentro do seu saco próprio para o efeito e pendurou-o no roupeiro para que não se enrugasse... assim estaria tudo perfeito... para voltar a saltar do roupeiro ao ritmo de um novo telefonema...

4 comentários:

Expresso Oriente disse...

adoro o ritmo que dás aos teus textos. fica a pergunta no ar... o que iria ele fazer? a início pareceu-me que era trabalho, mas no final ficou um certo mistério...

InterRegionalíssimo disse...

Ando a aprender contigo a arte do "suspense"... AHAHAHAHA ;) mais não resulta porque a mim ninguém lê... sou um triste ;)

InterRegionalíssimo disse...

olha escrevi em BRASILEIRÊS ;) "mais" em vez de "mas"... não sei porquê, ainda se fosse em Chinês... ;)

Expresso Oriente disse...

eheheheheh.
leem, leem... temos 200 visitantes diarios!