quinta-feira, 3 de maio de 2007

O caminho da vida...

Imagem de Renato Marques "Samurai-R"

Já é tarde!
São duas da manhã e lá fora chove à mesma intensidade que foi a tua vida.
Recostada à janela embaciada do frio da noite daquela locomotiva, vejo-me do lado de fora. Embora nada nítido, e com o agravante problema de miopia que carrego comigo, fruto das noites de leitura à luz das velas (…”Como eram Românticas!”…), aquela pequenina lourinha com ar de traquinas a massacrar o juízo do seu pai, era EU!
Como eu gostava de Birras! Quer dizer, gostava é a favor, de certeza absoluta que ainda hoje meio universo deve achar o contrário, não é meu Samurai??!!??
Ouviu-se dos altifalantes da estação uma voz sonolenta de uma mulher a informar aos passageiros que um tal comboio partia daqui a 5 minutos.
A loirinha desatou-se a chorar. Berrava alto e bom som, que até abafava o ruído das máquinas que se preparavam as suas viagens, carregadas de passageiros, malas, animais de estimação, tudo e mais alguma coisa. Pareciam a barca de Noé!
O Pai, aquela figura forte e alta, cheio de vida, de barriguinha do tinto e de cigarro na mão (…”Maldito vício que te embarcou naquela viagem sem regresso”…), tentava pacientemente acalmá-la:
- Russa, minha filha, o comboio não se vai partir ao meio. É apenas uma questão gramatical…
Soltei um sorriso amarelo e abanei a minha cabeça…quem me dera que a tua partida não passasse de mais uma brincadeirinha da língua de Camões. Mas não!
Infelizmente, quando voltei já não te encontrei mais no apeadeiro que da última vez me despedi de ti.
Hoje sigo a minha viagem, no comboio da vida, transportando dentro de mim a semente da esperança.
Não importa o tempo; o espaço, se vais no TGV, no Alfa, no Inter-cidades, no Inter-Regional ou mesmo no Regionalíssimo, nem interessa em quantas estações principais e apeadeiros são necessárias de percorrer, ou mesmo se alguma vez for preciso fazer algum “transfer”.
Importante é viver a viagem intensamente, com toda a nossa força de vontade e, que no destino encontremos todos os nossos sonhos realizados.
Do mesmo lugar que te disse “Até logo, Pai!”, vejo os rastos que o teu comboio deixou ao longo dos caminhos-de-ferro. Meus olhos já não alcançam mais os sinais daquela máquina poderosa, mas sinto-te.
Partiste no “Descansa em paz”, deixando em nós o sentimento de gratidão e muita SAUDADE…


Saudade, Saudade, não sabemos de onde vem, nem para onde vai, só sabemos que tua memória das nossas vidas não sai mais…AMO-TE PAI!!!

2 comentários:

InterRegionalíssimo disse...

Sem palavras... a mais bela homenagem que já alguma vez vi...

Expresso Oriente disse...

Bem-vinda e obrigada por nos presenteares a todos com este belíssimo texto.