sexta-feira, 25 de maio de 2007

A quem nunca vi


Foto por daniel camacho


Era já noite cerrada... deitado no seu lugar naquela carruagem fria tentava enroscar-se o máximo que podia a um pequeno casaco... único agasalho que possuía. Era verão, pelo menos era o que o calendário dizia, mas o frio que se fazia sentir parecia querer fazer acreditar a todos que estávamos no pico do inverno... enroscado, meio tapado... ali permanecia ele, tentando aquecer-se há longas horas. A cada vez que a porta se abria e dava lugar a mais uma entrada ou saída era como se a fogueira que tanto se tinha esforçado por acender se apagasse com uma bola de gelo, caída dos ramos de uma qualquer árvore próxima.

Era uma noite fria, muito fria... mas luminosa... uma lua gigante brilhava lá fora e os seus raios entravam abruptamente pelas vidraças cada vez que no trajecto o arvoredo se esquivava... mas nem essa luz o aquecia... era branca... branca com a neve... num tom quase azulado... fluorescente... e também ele gélido.

Enroscado, ali permanecia... na mão apenas segurava uma fotografia enroscada e desbotada pela chuva, sol e suor... fazendo lembrar o caminho pelo qual passara... tal como o homem... que também não era velho... nem novo... digamos que era de pouca idade mas que a vida e as agruras já lhe tinham tomado conta do seu aspecto mais jovial... segurava entre mãos aquela fotografia... acredito mesmo que era essa a única coisa que o aquecia... para ele, aquela imagem era com o núcleo de uma fogueira que lhe aquecia o coração... mas da fotografia já pouco restava... apenas se vislumbravam alguns traços, talvez um rosto... perguntei-lhe quem era... apenas me respondeu: é parte de mim... uma enorme parte de mim...

Dedicado a alguém muito especial que nem sequer sabe que o é...

2 comentários:

Expresso Oriente disse...

como é que não pode saber?
bonita homenagem.
vamos lá a aquecer esse comboio :)

Tuc-Tuc disse...

Sem palavras...Linda homenagem!
Mas podes crer que ele sabe o quanto especial que é...